quarta-feira, 8 de setembro de 2010

A Origem (IV)

...de muitos erros

Agarre-se a este fio, em meio a este labirinto, caro leitor, talvez necessite:


Parte (I)

Um sonho dentro de um sonho

Parte (II)

A velocidade de operação da mente

Parte (III)

Era vermelho meu Jeep de lata?



Antes de enveredarmos por perigosos e escorregadios caminhos de uma captação mental da realidade e seu processamento, devo destacar que o registro da cor do vestido de Talulah Riley em ‘A Origem’ ainda não me veio à lembrança, nem provavelmente, registrou-se em minha memória, exatamente por não causar impacto emocional algum (só lamento, gosto é gosto, e este não se discute, quanto muito se lamenta).


O fator emocional no registro de informações em nossa memória é importante, e se excessivo, como nos extremos stresses, como num acidente ou numa tragédia qualquer, pode ser até negativo. Assim, não é por covardia que senhoras idosas esquecem até a cor da pele e cabelos de assaltantes, ou mesmo pessoas tem em momentos de pânico, por exemplo durante um incêndio, esquecidas suas rotas de fuga, por mais tempo que trabalhem ou residam naquele prédio.

Garanto que saberia detalhes até da textura do tecido se a personagem fosse representada por Megan Fox ou Natasha Henstridge, mesmo num incêndio e após um assalto!

 
Temos certas lembranças que são como a pintura holandesa de nossa memória, quadros de costumes em que as personagens são muitas vezes de condição medíocre, captadas num momento bem simples de sua existência, sem acontecimentos solenes, às vezes sem qualquer acontecimento, numa moldura em nada extraordinária, sem grandeza. - Marcel Proust; Os Prazeres e Os Dias - XVIII - Quadros de Costumes da Lembrança
 
 
 
Existe um totem confiável?


Ou, noutra pergunta, mais sofisticada, existe uma metafísica absoluta construível?
 
Na obra que motivou este conjunto de textos, pode Cobb saber se o coerente mundo em que está agora vivendo com seus filhos não é apenas tão irreal quanto mais uma absurda praia de edifícios eroindo?


 
Apolo guardava os rebanhos de Admeto dizem os poetas; todo homem é também um deus disfarçado que imita um louco. - Emerson


Tal como um esparadrapo, façamos a remoção rápida e respondamos diretamente: não.


Não temos confiança absoluta nem em nossa razão, nem mesmo em nosso estado de consciência, nem em nossas apreensões da realidade, que sempre passam pelos sentidos.

Nota importante: nada, caro leitor, coisa alguma, existe em sua mente, quanto à uma avaliação e tratamento do mundo que não tenha sido captado pelos sentidos, no perceber o externo, ou processado em sua mente, quando inclusive, recebe inspirações de inexistentes - pelo menos achamos - unicórnios róseos. Somos prisioneiros de nosso aparato corporal e da operação de nosso cérebro, e com eles captamos e tratamos o mundo, e julgo que nada mais existe, a menos que tal se apresente claramente, e cuidado, pois além de os sentidos iludirem a mente, a mente erra, e somente a mente mente a só.

Pensemos, primeiramente no científico: não temos na verdade, idéia exata do que seja o universo, nem mesmo, a matéria, exatamente os campos, nem sabemos exatamente como descrever o que sejam as partículas (na verdade, tratamos apenas de seu comportamento, e com limitações). A natureza é um tanto imperscrutável. (O exemplo neste dicionário já pode ser uma ironia do universo, pois juro que não colaboro com ele.)
 
Assim, costumamos, quando abordamos debatedores que tentam tratar de física e ciências com certezas que não se sustentam e seguranças que não existem, atormentá-los com perguntas padrão:


Como se divide a matéria e até que nível isto ocorre? Como pode-se afirmar algo além do que observamos? Pode-se afirmar que o universo é tudo? Como podemos afirmar o tempo como sendo o que venha a ser se nele estamos presos? E diversas outras.

E uma que prefiro, em especial a quem afirma que conhece todos os supremos mistérios do universo, o além do físico, desde seu todo até seu íntimo, os fundamentos primeiros do tudo-que-existe, e inclusive, é amigo do rancoroso sujeito que o administra, além de tê-lo fundado e construído:

Quantos cabelos tens na cabeça?

Pois se não sabe-se nem dados próprios, como vai se ter noções de tudo?

Nota: Aqui, a leitura de Kant é sempre uma luz na mais profunda penumbra, que julgávamos e muitos ainda julgam a mais ofuscante claridade.

Como não faço nem idéia disto (na verdade, os estimo), e nem sei sequer se todos os corvos são pretos, e os vejo diretamente, e me submeto aos limites da razão e da apreensão de meus sentidos e neurônios de primata, não afirmo o que seja, mas apenas divulgo o que jamais, relatam inclusive outros primatas mais capacitados que eu, evidenciou-se diferente.

Assim, poderíamos estar vivendo numa caixa de formigas de uma civilização alienígena, num vídeogame dos mesmos, numa “matrix”, em diversas variedades de tais estados conjecturais. Note-se com atenção que afirmo “poderíamos”, e não que “estamos”, e devo citar até mesmo num “sonho de Brahma”. O deus das lacunas não existe, mas existe as lacunas para se colocar deuses, cunhei recentemente.


Logo, não existe pião de Mal, nem peão de Ariadne algum, que não seja, no mínimo, suspeito.
 
Muitos talvez aqui, e em discursos similares, já enfiem em tais lacunas certezas inconsistentes, raciocínios invertebrados das seguranças de suas fés, sejam elas quais forem, e em contradição exatamente com o afirmado, gritem aos céus certezas que como mostra-se, não possuem.
 
Uma máxima útil:

Duvida de tua fé, duvida de ti mesmo, duvida até de tua dúvida.


Sobre o ombro do busto de Palas, está um corvo de cor indefinida, gritando, que certezas, nunca mais.

Mas temos que fazer, portanto, escolhas, e saber qual escada subir na nossa suposta existência, e no que confiar predominantemente.





Devo a todos, e tenho acumulado rascunhos, um conjunto robusto de textos sobre estas questões do que seja uma atual metafísica (de certa maneira, novamente uma ironia), pois do epistemológico já tratei noutro texto, mas acredito que o aqui tratado já aborda convincentemente a questão: não se constrói mais metafísica sólida alguma, e só podemos contar com o confiável da física - num sentido mais popperiano, fundamento de todas as ciências naturais e formais.


Intersectam-se nossos mundos/sonhos com outros mundos/sonhos?

Apenas como acréscimo, poderíamos nos perguntar se mesmo no natural podemos afirmar que o que detectamos, direta e indiretamente, pelos sentidos e nossos instrumentos, é o que existe aqui e agora, em “nosso universo”.

Em cosmologias conjecturais, pois os termos ‘vanguarda‘ ou ‘de ponta’ podem parecer um tanto arrogantes ainda que não pernósticos, existem tipos de multiversos - múltiplos universos - onde dois universos distintos ocupam o mesmo espaço e tempo, sem interação alguma, pois suas partículas - em grupos - não interagem de forma alguma. Explicando novamente: Podemos perfeitamente dividir o mesmo cenário espaço-tempo com outros universos de imensa variedade de partículas, porém, que não interagem com as do nosso. Assim, os multiversos deste tipo dividem a mesma estrutura, mas sem serem perceptíveis um pelo outro.


Uma analogia grosseira seriam gotículas de óleo e água, em neblinas esparsas no ar, que mesmo quando colidem, ainda não se misturam. Aceito sugestões de outras analogias.

Observemos que se este universo em paralelo, “co-espacial”’ com o nosso, se apresentar uma defasagem temporal, ou inversamente, for “co-temporal”, mas em termos espaciais, por exemplo, apresentar uma expansão diferenciada do nosso universo, ou mesmo uma termodinâmica diversa, com seta do tempo diversa (onde xícaras caídas se remontem naturalmente subindo às mesas de onde caíram, e mais que tudo,, a situação de complica, e poderia tal se dar em múltiplos níveis de combinações, em cruzamentos inúmeros, sem colisão alguma.


Logo, Neo, não só não está mais no Kansas, como talvez, ele não tenha sido o que você julgava, e nem mesmo tem-se certeza do sutil tom predominante, como o verde, da Matrix onde está aprisionado, ou ainda, dentro de uma van caindo de uma ponte, não necessariamente, a queda está se dando conforme indica, ainda que sonhando, nossos centros de equilíbrio, nem muito menos, como,com as leis de Newton que achamos que o mundo funciona, nem mesmo como, mesmo funcionando, sejam coordenadas no tempo conforme o relógio do painel, pois este, e tal é claro, está dentro da van.

Por outra abordagem, o solipsismo num certo nível pode ser plenamente desprezado, por pura inutilidade, mas não pode ser aniquilado como possibilidade. É um fantasma que nos atormenta permanentemente em nossos sonhos, e os transforma de certa maneira, em um angustiante pesadelo. Não há queda que nos acorde, não há afogamento que nos salve do limbo onde estamos mergulhados.




Observação: Invariavelmente, a versão inglesa do artigo da Wiki me causa a típica inveja primata.


Mas podemos afirmar que é coerente o sonho ou a Matrix onde talvez vivamos? Ou nas dúvidas que me atormentam, meu Jeep que eu julgo ter existido refletia luz de comprimento de onda correspondente ao vermelho e descia com aceleração newtonianamente coerente a calçada da rua próximo a minha casa?
 
Ou ainda, citando A Origem, seria a física de nosso mundo alterável sem isto ser perceptível e detectável por nossos sentidos, instrumentos e principalmente razão? Ariadne deformaria Paris, modificaria miraculosamente passarelas e ainda julgaríamos o mundo coerente?

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