Sentado num restaurante simples em Campinas, em mais um de meus n^k ("ene na capa") almoços sozinho num dia de visita em local distante de minha residência, ouço duas senhoras (posteriormente identificadas como enfermeiras) conversando sobre um documentário que assistiram que tratava de questões da Mecânica Quântica, em especial, o Gato de Schrödinger.
Claro que não resisti de me meter na conversa.
Estas senhoras estavam espantadas de como a Física "moderna" está distante dos sensos - diria populares - que temos de como realmente a natureza seja.
A partir deste primeiro ponto, do dito gato e o que representa este experimento mental, parti a conversar com elas sobre diversos pontos que mostram o quanto a natureza supera em muito nossos mais loucos devaneios de certeza, solidez, e até de nosso próprio conhecimento sobre o que ela realmente seja.
O resultado desta agradável conversa foi o "esboço mental" de um artigo simples mas geral sobre os limites da Física, o que se sabe hoje, o que nos promete o futuro e os limites que nunca ultrapassaremos.
A incerteza
Quando eu olho para uma bola de bilhar sobre uma mesa, "ela está ali" - e veremos que realmente, está num conjunto enorme de pequeníssimas regiões, que somadas, são a própria bola - e meu olhar não modifica o que seja esta apreciação, pelo menos significativamente.
Por outro lado, quando um elétron ou um quark (e alguns deles já formam os prótons e nêutrons dos núcleos atômicos) "existe", "está" em algum lugar, ou está em movimento, eu não tenho como o ver de forma alguma, até pela sua natureza de "partícula elementar". Eu passo a ter alguma informação dele quando emite um fóton, que por um mero acaso, rumará em minha direção (ou de algum instrumento meu) e impressionando-me (retina ou sensores) terei informação de sua posição ou velocidade, mas ao ter feito isso, frações mínimas de segundos atrás, como do um metro de meus olhos até a bola de bilhar que destas partículas é formada.
Obs.: Lembremo-nos sempre que mesmo distâncias pequenas como 1 metro, e diria até microscópicas como 1 nanômetro, implicam num determinado intervalo de tempo para termos a captação de qualquer fenômeno, mesmo em velocidades enormes como a da luz. No caso, esta bola de bilhar encontra-se 3,3 x 10^-9 segundos ou 3 bilionésimos de segundos, não sejamos exageradamente preciosistas, no passado, e mesmo para o caso de um nanômetro, como colocamos, o tempo ainda seria de 3 bilionésimos de bilionésimo de segundo (3 x 10^-18 s), um valor muitíssimas vezes maior que o tempo de Planck (aprox. 5,4 x 10^-44 segundos), uma curiosa e importantíssima medida de tempo, o que veremos adiante. Sendo mais preciso, 3 x 10^-18 segundos é 6,1 x 10^26 tempos de Planck.
Bolas de bilar, minha analogia preferida para se entender a diferença entre o mundo macroscópico, das quantidades "molares" e o mundo subatômico. Temos a quase compulsão de que o menor se comporta como este exemplo do maior. |
Assim, temos que o meu observar é fruto do alterar a posição ou a velocidade de uma partícula - percebam o nexo causal: repitamos, o alterar a posição ou velocidade que com emissão permitiu eu (ou instrumento) detectar a posição ou velocidade "anterior" da partícula, e não foi meu observar que alterou a posição e/ou a velocidade. Parece a mesma coisa, mas uma distorção, diria desonesta, disto, é que faz com que certos autores em busca de vítimas* e não de interessados começarem a afirmar que minha consciência é que ao observar o mundo, a altera.
* Recomendo:
- Victor J. Stenger; Charlatanismo quântico - ateus.net
- Ernesto von Rückert; Existência do mundo independente de observadores - www.ruckert.pro.br
Por mais esforço que faça com minha mente, não alterarei a velocidade e posição de um único elétron a um metro de distância, quanto mais, bilhões de bilhões deles formando uma bola de bilhar que seja, quanto mais, milhares de vezes mais massa nos núcleos de seus átomos.
É o alterar permanente do mundo que forma nossa percepção, e não nossa percepção que nos dá 'poderes cósmicos fenomenais' de alterar ao menos que seja a posição de uma partícula coloidal num movimento Browniano, berço observacional dos comportamentos aleatórios da natureza.
Para uma leitura digerível e sem sacrifícios tremendos de Física + Matemática (normalmente, para não profissionais da área, uma quase impossibilidade, ou normalmente, um tédio inútil):
Princípio da Incerteza de Heisenberg - www.gta.ufrj.br
A produção de par
As partículas "vetores" da energia, na forma de radiação eletromagnética, os fótons, formam pares de partículas, no caso, uma partícula e uma antipartícula (como o elétron e o anti-elétron).
Tratei isto divertidamente aqui: Um fóton
Mas realizando a dificílima façanha mental que é traduzir o lusitano, mais formalmente:
A produção de par é um processo de interação eletromagnética do fóton com o campo elétrico do núcleo do átomo. Dessa interação resulta que o fóton "deixa de existir", formando-se um par de partículas elétron/pósitron. Chama-se 'materialização de energia' a este processo, uma vez que se produzem partículas materiais a partir de radiação eletromagnética. Pela lei da conservação da massa-energia, a produção de pares apenas ocorrerá se o fóton tiver uma energia superior a 1,022 MeV que é o dobro da energia equivalente à massa de um elétron em repouso: hυ>2mec^2.* A energia cinética do par elétron/pósitron será tanto maior quanto maior for o excesso de energia do fóton em relação a 1,02 MeV. Além disso este processo somente ocorre na presença de matéria, dado que é necessária uma troca de quantidade de movimento com um núcleo pesado para que se conserve a energia e a quantidade de movimento.
Ref.: Produção de pares - www.lip.ualg.pt
* Noutras palavras, só é possível esta transformação quando o fóton tem frequência superior a determinado valor (que relaciona-se com a energia pela Lei de Planck, E=hf, ou E=hv), o que nos leva a raios gama, e com a correspondência da massa com a energia pela universalmente famosa, mais que popular e seguidamente pouco entendida de fato E=mc^2 da Relatividade Geral, já que para haver determinada quantidade de massa (o elétron e o pósitron), tem-se de por esta relação, também de dispor de determinada quantidade de energia.
Então, se tal ocorre, "hoje", num passado remoto, de muito mais densidade e temperatura (Big Bang, obviamente) uma quantidade enorme de energia pode ter produzido toda a massa (e talvez algo a mais, já veremos) que hoje vemos pintando este fundo preto que é o limite visível, ou melhor, invisível de nosso universo, mas...
O que é - realmente - o universo?
Tal como para as duas agradáveis senhoras, em breve eu não respondo.
O que é - realmente - o universo?
Tal como para as duas agradáveis senhoras, em breve eu não respondo.