sexta-feira, 17 de maio de 2013

Sobre o "provar a inexistência"

A partir de um debate sobre o tema

O chamemos "F":

F:

É impossível provar a inexistência?

Eu sempre vejo muita gente dizendo que é impossível provar a inexistência de algo. Também vejo muita gente dizendo que só se pode provar qualquer hipótese a partir do método experimental. Pois bem, gostaria de saber a opinião de vocês sobre esta hipótese:

Existe um triângulo de quatro lados na superfície de Marte.

Sendo um triângulo um objeto geométrico formado por três ângulos e três linhas retas, inscrito num plano e cuja soma dos ângulos internos é igual a dois ângulos retos.


A pergunta é:

Seria possível a existência de tal objeto no superfície de Marte ou em qualquer lugar do universo? Se a existência de tal objeto for impossível não se prova a inexistência de tal objeto? A prova necessita obrigatoriamente passar pelo método experimental?



Eu:

O exemplo citado na verdade é inadequado, pois não existem objetos geométricos de espécie alguma na natureza. São entes abstratos, frutos da lógica sobre axiomas, que é a matemática, em determinados campos, no caso, geometria. 

Logo, se foram definidos os axiomas, e seguida determinada lógica, o "objeto" não é inexistente, mas impossível de ser imaginado, o que são coisas completamente diferentes.




Um cisne preto, só conhecido no ocidente no século XVIII.



A questão da impossibilidade da demonstração da inexistência é mais adequadamente demonstrável por questões simples, banais, como seguindo os exemplos inicialmente propostos por Bacon (talvez com anteriores!), e desenvolvidos por muitos outros (destacadamente Popper e Russel, chegando-se a um ser/objeto completamente entendível e descrito, e apresentando-se uma característica jamais observada, como os cisnes pretos (na verdade, há muito um falseamento) ou o meu preferido, o "corvo vermelho".

Acrescentar-se a isso delírios como bules de chá em planetas, anões no Sol ou mesmo fadas, é apenas um exagero do discurso.

Mas as bases da indemonstrabilidade estão aí.

Em tempo: por Matemática, em qualquer de seus campos, e consequentemente por lógica, jamais se chega a um entendimento da natureza em si, quanto mais a demonstração da existência ou inexistência de qualquer coisa.

O formalismo é o que resta em Matemática aplicada, e construtivismo em Física está morto e enterrado, predominantemente pelos "irracionais transcendentes aleatórios", ou "constantes ômega", que prefiro chamar de números de Chaitin.

Obs.: Contante ômega, "a original". - Wiki {en}

Em caso de renitência, demonstração, talvez em 10 linhas.


philosophiesofmen.blogspot.com


F, a "R", outro participante do debate:


Eu entendo você. Você tem alguma razão ao dizer o que está dizendo. Mas acho que você está sendo conservador demais. É a mesma coisa que observar cisnes brancos numa lagoa e dizer que só existem cisnes brancos. Aí você  vai a outra lagoa e vê cisnes pretos e diz que não são cisnes, que só existem cisnes brancos.

O que eu quero dizer é que a maioria das propriedades que atribuímos a algum ser são arbitrárias. Quer dizer elas não envolvem nenhuma necessidade. Nós só atribuímos estas propriedades porque a experiência nos ensinou a ligar tais propriedades a tais seres. Nada impede que algum dia, em outro planeta, ela nos ensine a ligar outras propriedades a seres semelhantes.

F a mim:

Mas isso não é uma prova de inexistência? E mais, não é uma prova não experimental?

Eu:

Sobre cisnes brancos e "propriedades arbitrárias".

Sim, exatamente pois as definições, nomenclaturas, classificações e até postulados científicos são acordos, oriundos, normalmente, de sensos comuns.

Interessante é, por exemplo, o conceito de dimensão.

É óbvio que dizemos que são três espaciais pela nossa tradição euclidiana, mas na verdade, a natureza se lixa para isso.

Obs.: Entenda-se que a natureza "É", e o que observamos e afirmamos dela não é como ela tem de ser, e sim, como a apreciamos e afirmações que construímos para ter a melhor avaliação de como ela seja. Ela não muda em função de nossos desejos.

Acrescento: Embora seja uma obviedade que mudo a posição de uma pedra por assim o desejar, mas não mudo as leis e composição que regem e fazem a pedra ser o que é, e poderia por minúcias nesta questão até a exaustão, e acredito que o ponto fique bem entendido, da mesma maneira que me parece banal que não podemos mudar o nascimento do Sol, ou sua evolução até extinguir-se como estrela que nos seja útil, etc.

Continuo:

Bem analisada, a natureza, por exemplo até na Gravidade Quântica em Loop apresenta-se mais tratável por um "grafo", uma espuma de espaço-tempo borbulhando para todos os lados, em "quanta espaço-tempo".



universe-review.ca



Muito do que fazemos em Biologia, por exemplo, são o que chamo de "aristotelismos classificatórios". Assim, é óbvio que me classifico como humano, mas na cladística, não apresento separação alguma, no espaço e no tempo, no cladograma, das baratas que piso (toda a vida tem uma continuidade no tempo, até encontrara-se um táxon completamente separado). Noutras palavras, poderia eu, se habilitado por algum cósmico poder, viajar entre todos os ramos do cladograma geral da vida, percebendo os parentescos de toda ela ao longo da história.


blog.geoffchristou.com


Assim, classificamos cisnes não só por sua óbvia capacidade de cruzamento (no que classificamos até gênero, como entre cavalos, asnos e zebras, ou entre vacas e bisões, e mais distantes, búfalos e demais bovinos), mais tecnicamente, pela genética.

Em suma, continuamos com o problema do "o que é uma rosa", ainda mais profundo e definitivo de "qual o nome que deus da à rosa", típico da Filosofia Medieval.

Aliás, daí o título "O Nome da Rosa", do livro de Umberto Eco.

A natureza não possui "isso ou aquilo", mas apenas as agregações, pelas forças interativas, de seus componentes, os verdadeiros entes, que são as partículas (ou seriam adensamentos de campos?).

Assim, a questão continuaria, se considerarmos a "forma", de um "anão", ainda que apenas nisso um "anão", no interior do Sol, ou algo que parecesse um bule orbitando Saturno (?) ou mesmo, gnomos verdes guardando raríssimos corvos vermelhos, abduzidos em nosso passado.

Assim, só podemos afirmar, apenas com confiança limitada, a existência de algo pela observação e experiência, e não o sim ou o não de sua existência, a partir do raciocínio, por modus ponens, até pois nossas premissas sempre são pouco confiáveis.

Só nos resta, pois, o modus tollens.



Voltando a:
"Mas isso não é uma prova de inexistência? E mais, não é uma prova não experimental? "

Primeiro me responda:

1) Existe um único triângulo no universo, material e detectável ou são apenas abstrações de sua mente?

2) Pode se apresentar uma única experiência a se fazer, no sentido popperiano de experimento, com um único triângulo?

Em tempo, me apresente uma medida, em uma unidade que seja exata, evidentemente perceptível na natureza, que se adapte a alguma forma geométrica ideal ou perfeita.

Pediria, por exemplo, a diagonal de um quadrado, que por ter lados inteiros (p.ex.), terá de ter diagonal em valor irracional, e infelizmente, para seu argumento, não existe comprimento em fração do comprimento de Planck que tenha nexo para a medição humana.

E como irracionais podem ser definidos pela soma de infinitas frações...

Obs.: E ainda que tal fosse discutível - e é, nem "meio átomo", quanto mais fração de infinitas casas decimais de átomo, exatamente porque na natureza as coisas não são contínuas, como compostas de infinitos pontos, infinitamente divisíveis.

Infelizmente, o universo não é geométrico euclidianamente falando, mas apenas modelável em geometria, e limitadamente.


Como sempre, recomendamos a leitura de: The Limits of Reason, Gregory Chaitin
Para as questões referentes à Gravidade Quant. em Loop - Quantum Foam and Loop Quantum Gravity - universe-review.ca


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