terça-feira, 17 de junho de 2014

Dados lançados, cartas na mesa, células na lâmina


e uma verdadeira "Lei de Borel"

Qualquer pessoa que pense em probabilidades mesmo em jogos triviais como os dados e as cartas sabe, diria intuitivamente, que não cairá - melhor dizendo - dificilmente cairá uma sequência de 10 lançamentos seguidos com o dado mostrando para cima o número 6 (basta lembrar a dificuldade que é tirar os cinco dados iguais, o "general" no jogo de mesmo nome, ou "pôquer com dados"). Da mesma maneira que ao se jogar cartas embaralhadas sobre uma mesa não cairão banalmente ordenadas por naipe (de ouro a paus) e em cada naipe de Ás a Rei.

Mas aqui entra o Lema de Borel Cantelli, que demonstra que tal combinação, numa sequência infinita de lançamentos ou distribuição de cartas, propiciará uma sequência tão grande quanto se queira, ou cartas que “cairão” exatamente como afirmo.
É evidente que em associações de moléculas polimerizantes, como os aminoácidos e as bases nitrogenadas, não produzirão numa polimerização e associação, combinações colaborantes, aleatórias* não produzirá jamais num recipiente um unicórnio, ainda que nós, os crentes de U.R.I., isso não aceitemos.

* E aqui as combinações são imensamente mais complexas, longas e "distribuídas" que dados de seis lados ou cartas de quatro naipes e 13 faces.
As combinações não serem possíveis aleatoriamente, em tempo hábil num universo limitado em idade sob determinadas condições**, não implica, em se removendo o teleológico, o pretendido ser vivo, por mais simples ou mais complexo que o seja, de não ser, quando "se chega nele" ao acaso, perfeitamente factível.
** Já que acredito que ninguém acredita que um beija-flor ou uma petúnia sobrevivessem no vácuo quando uma supernova de geração anterior a do Sol explodiu - se acha este discurso desconexo e até insano, não esqueça que em suma, fixistas afirmam isso, logo, todo fixista é obrigado a ser um criacionista quando se usa de argumentações cosmológicas para o passado da vida e da própria Terra.
Explico aqui por outra via este pensamento: cair um conjunto de dados perfeitos que seja/represente o unicórnio é impossível, mas pelo meio do caminho, uma combinação, fruto do biológico/estocástico, que resulte no cavalo, na zebra, no asno, no pônei da Mongólia, e até pelo caminho diversos equinos, e antes, ungulados até com chifres, ímpares e centrais, constituídos de pelos agrupados, como todos os rinocerontes e seus parentes, é mais que factível. Isso sem falar em todas as etapas de todos os ancestrais dos hoje equinos em toda a história da vida, passo probabilístico a passo probabilístico, por milhões de gerações, desde uma simples - simplíssima - bactéria.

A. synthetocorus , uma mostra que os mamíferos já produziram coisas impensáveis até para quem pensou num unicórnio o achando impressionante. - markgelbart.wordpress.com


Logo, na exata medida que a "lei de Borel" dos criacionistas é uma falácia (e mais que isso, uma simples mentira) e a falácia de Hoyle uma modelagem errônea de como se dá o biológico, tanto na polimerização, quanto na biopoese, quanto na genética, exatamente pelo combinatório possível, numa área diminuta do permissível, fisicamente factível, do completamente permitido pelo infinito do lema de Borel Cantelli e pela genética que não constrói um 747, mas compõe pelos seus processos e mecanismos algo tão complexo em milhões de anos (seja um cavalo, seja talvez até algo parecido com um unicórnio, e talvez até de cor rosa, porém certamente visível).
Toda a vida é portanto o resultado, seja em sobreviventes, seja em já extintos, das combinações possíveis, não os passos de um projeto, e se tal projeto existe, é da fé de quem nele acredite, mas certamente, indetectável e indelével.

Assim, acrescento ao clássico texto de Paley que o relojoeiro até pode existir***, mas esconde sua ação com artimanhas muito superiores a que qualquer habilidade de artesão que a ele se atribua.

Sutil é o senhor...Nota 1


*** Observação: E a própria real autoria do design sempre é discutível, como demonstramos neste artigo.
Lembrando que digo e repito que toda afirmação de ação de uma divindade sobre sua criação implica em esta ser um incapaz, o “artesão atrapalhado”, como o diz Francis Collins.
Tentar mostrar tal artesão atrapalhado e incapaz por argumentos matemáticos é uma tolice a emoldurar outra, quando não, pintando com mentiras reluzentes a madeira rota de argumentos teleológicos há muitos enterrados.


Notas

1. Título que diz muito de teístas e deístas honestos, quando tratam de como conciliam a ação de suas divindades no mundo, frase oriunda do título do livro de Abraham Pais, "Sutil é o Senhor...": A Ciência e a Vida de Albert Einstein (comentários sobre o livro em www.fisica.ufmg.br )


Leitura adicional e diria, obrigatória


quinta-feira, 12 de junho de 2014

Da utilidade da Paleontologia



Nos meus já alguns anos conhecendo o pitoresco mundo dos criacionistas e sua constante argumentação baseada, erroneamente, mesmo dentro de sua ótica, em atacar as afirmações da Teoria da Evolução, contra o fato da evolução, contra afirmações históricas da Paleontologia,  e até mesmo contra aplicações sólidas, de todo bem sucedidas, e participantes em nossa vida diária de diversas afirmações dos modelos da Teoria da Evolução em vastos, utilíssimos e nevrálgicos campos como a Medicina, a Agricultura e a Pecuária, sempre encontro-me com um “sub-argumento”, que questiona de que serviria saber, por exemplo, quais os ancestrais do cavalo doméstico.

Observação: Gosto sempre de lembrar que esperneiam até mesmo contra a mais que evidente seleção natural, contraditoriamente dentro de sua argumentação, beirando o insano, contra até o dilúvio universal que claramente selecionou muitas espécies, pois me consta que dinossauros claramente não entraram no pitoresco canoão.

É evidente que entendem mesmo os criacionistas que um vírus muta, e seus filhos ou netos vão morrer se a próxima vacina não levar em conta tal mudança. Entendem isso mesmo no seu tipo especial de variações - no tempo - que são os “baramins”, e seu acelerado processo de modificação limitado ao extremismo que fazem, ainda mais pincelado com o termo por eles corrompido de “microevolução”. Idem para a bactéria, que adquire, em cepas sobreviventes, resistência ao antibiótico que numa dosagem parcial, abaixo da mais criteriosa recomendada, permitindo bactérias variantes da população da contaminação inicialmente sofrida. Também acredito que os mais radicais criacionistas do cinturão bíblico estadunidense não discutem com seus engenheiros agrícolas (talvez estes mesmos criacionistas) sobre a resistência adquirida por populações de insetos e ervas daninhas a defensivos agrícolas.

Portanto, me concentrarei neste texto no aspecto da ancestralidade fóssil das formas de vida atuais e mesmo de táxons completamente já extintos, e espero a compreensão dos amigos e leitores das ciências biológicas, pois faremos papel um tanto de “advogado do diabo”.

Devo adiantar que uma argumentação do tipo “o ser humano tem o desejo incontrolável de conhecer” não seriam de forma alguma útil, e nem prudente, no que apresentaremos.

Pulemos os “detalhes”, da anatomia comparada, da análise genética feita sobre formas atuais e até em tecidos de algumas (e mesmo hoje já muitas) formas de vida ancestrais, pois fará parte de nossa argumentação que rumará por cortar o que negam “nossos amigos”.

Em suma, minhas indagações, que pretendo com coragem responder, são, exemplarmente, além da do cavalo, já citada acima: Qual a utilidade de sabermos que o tiranossauro descende de uma forma - próxima - de um alossauro primitivo modificada. Outra: Qual a utilidade de sabermos que determinado mamífero ungulado produziu o baluquitério, o rinoceronte e até a girafa, a anta e o tapir? Ainda outra: Qual a utilidade de eu saber que existiram os trilobitas, sua variedade e sua árvore genealógica? Gostaria ainda de colocar outra: Qual a utilidade de sabermos que a primeira forma animal que dominou a terra foram escorpiões marinhos?

Poderia estender estas pergunta por páginas, como para que sabermos que insetos gigantes existiram, que voavam entre enormes samambaias, que baleias primitivas com pequenos restos de patas singraram os mares que hoje nem existem, e que estes tornaram-se montanhas, etc.

Todas estas perguntas, pertinentes e dignas a um paleontólogo de anos de pesquisas para apresentar os seres envolvidos, com seus artigos e teses de doutorado, ainda enfrentaria a especificação em meu discurso de que o termo utilidade acima trata-se “nos dias de hoje e em nosso futuro”, e sempre pinceladas com a cor que imponho como tal nefasto advogado de que são perguntas sobre espécimes que nem mais existem em suas variedades de descendentes diretos, em ambientes geológicos que sequer ainda estão aí.

Pior ainda, que tais afirmações sejam feitas, pela própria natureza desta ciência, que produziu até erro de análise em Filosofia da Ciência de um colosso intelectual como Popper, a sua um tanto infeliz “especulação metafísica”, em tempos passados que são até milhares de vezes maiores que nossa própria história como civilização, mesmo centenas de vezes mais que nossa idade como espécie - perdão pelos termos - “definida e isolada” de nossos ancestrais, que até poderiam aqui ser longamente discutidos.

Pois bem, feitas minhas acusações, mudo minha toga e apresento a defesa, sob a ótica de um agora Gestor Ambiental, e humildemente, como uma pessoa que ganhou uma certa notoriedade no meio deste tipo de debate, e um certo “notório saber” que percebo pelas estatísticas de meus artigos e blogagens sobre o tema, e os apoios que recebo seguidamente de profissionais do ramo, e mais que tudo, pela ética envolvida ao que seja científico e o que seja mais que útil, extremamente necessário, como veremos.

Guardo ainda com feliz lembrança a citação que trouxe-me antigos estudos, ainda de secundário, de minha amiga Silvia Gobbo, geóloga e doutorada em Paleontologia, de que “ecologia fundamenta-se sobre evolução”, embora acho que os termos não foram exatamente esses, e surgiu um poético “bebe em”, no meio da frase.

Paleontologia, e espero que não fiquem criticando detalhes se colocar o termo Paleobotânica, não são somente ciências da história de espécies A e B, C e D, até as diretas relações de A com C e n outras combinações, como quem predava e quem era predado, e n’ outras letras que representem descendentes e ancestrais, números em índices que apresentem variações regionais, em toda a complexidade até de tratamento que é característica não só da Paleontologia mas da própria Biologia. Lembrando o grande Ernst Mayr, Biologia é uma ciência única.

Estas ciências de natureza “paleo” são as ciências das espécies e seu meio, e portanto, de sua ecologia, como sobreviveram ou não às mudanças de seu meio, e quais foram estas mudanças. Aqui, coloquemos bem destacado, pois é o objetivo direto de nossa defesa, o termo Paleoecologia. Nisto, todas as perguntas que virão a seguir devem sempre ter a elas presas a segunda parte “e as relações destes seres com todos os outros”.

Quem seria o táxon resistente a menos água? Quem seria o mais resistente à temperaturas mais altas? Quem seria o sobrevivente à diminuição das florestas e savanização do ambiente anteriormente luxuriante, tropical, chuvoso? Quem seria o táxon que apresentou mais descendentes aptos à acidificação ou alcalinização dos mares? Quem seria o mais resistente a uma sulfurização por uma grande erupção vulcânica?

Assim sendo, as ciências “paleo” podem nos mostrar num futuro de aquecimento (e mesmo glacial resfriamento), quais seriam os táxons de onde devem descender as espécies mais aptas a receber nossa ação para desde propiciar alimento, até apoiar determinadas produções de matérias primas. Devemos plantar as espécies A ou B? Devemos passar a conduzir nossas massas a preferir se alimentar de roedores? Devemos abandonar os ungulados de grande porte? Devemos passar a criar grandes felinos, que permitam durante décadas e até séculos que matas da Oceania e da Ásia se recuperem, não tendo herbívoros sem predadores a piorar o mal que já fizemos? Devemos fazer proliferar determinados insetos, ou mais pássaros de determinada família, ou ainda preferir répteis à cabras em nossas regiões áridas? Devemos desesperadamente colaborar com a sobrevivência dos diversos batráquios, que provavelmente sofrem com nossas emissões de gases, independendo do dióxido de carbono, que pelo histórico da Terra, já produziu efeito estufa catastrófico antes?

Sonhando um pouco, devemos trazer novamente grandes felinos, como superpredadores, e até colaborar com estes, se o lobos se extinguirem na América do Norte? Ainda mais além, devemos tratar de operar modificações e repor determinadas morfologias e metabolismos, em espécies inéditas mas similares a outras do passado? (Aqui, como exemplo, será que devemos produzir ungulados carnívoros, como já houve no nosso passado, e criacionista algum negaria este fato.)

Mesonychid (pt.wikipedia.org), ungulados digitigrados carnívoros - www.pasttime.org


Aqui entra todo o estudo das formas de vida do passado e sua história, mesmo que hoje remota, e perdoem, direta e simplestamente, sem utilidade. Aqui, lembremos que Paleontologia, Paleobotânica e a sistematizante - no termo relacionado a sistema complexo - Paleoecologia são campos históricos, com aspectos de fatos analisáveis, com ordem no tempo, causas e consequências, logo, num conceito mais amplo que o nosso estrito de “civilização”, História, pois até o universo tem sua História, e gravarei o termo com letra maíuscula.

História serve para sabermos os acertos que devemos copiar, para saber as similaridades dentro do possível que devemos buscar. Mais que tudo, para sabermos os erros que não devemos repetir, pois História, lembrando o adágio, é o conjunto de tudo que devemos evitar.

Assim, encerro minha defesa, e nego que as ciências com o prefixo significando distante no tempo e afastado de nossa imediata realidade e vida aparentemente segura são úteis. As ciências com tal prefixo são hoje, desesperadamente necessárias.

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Colágeno, uma nova adesão a velhos erros

Silvia Gobbo, Francisco Quiumento


Uma breve introdução à substância alvo deste texto


O termo colágeno deriva de ”aquele que gera cola”, sendo, como matéria-prima, das mais antigas substâncias de origem animal relativamente isoladas usadas pelo homem, inicialmente, na produção do que hoje chamamos de “adesivos de contato”, que incluem a vulgarmente conhecida “cola de sapateiro”.


Uma rápida lida na Wikipedia em inglês já nos dá um quadro de sua importância como proteína constituinte das estruturas dos animais mais complexos:


O colágeno é um grupo de proteínas de ocorrência natural encontradas em animais, especialmente na carne e tecidos conjuntivos de mamíferos. É o principal componente do tecido conjuntivo, e é a proteína mais abundante em mamíferos, perfazendo cerca de 25% a 35% do conteúdo total de proteínas do corpo. O colágeno, sob a forma de fibrilas alongadas, é encontrado principalmente em tecidos fibrosos , tais como tendões, ligamentos e pele, e também é abundante na córnea, cartilagens, ossos, vasos sanguíneos, no intestino, e nos discos intervertebrais. O fibroblasto é a célula mais comum que cria o colágeno. No tecido muscular, que serve como um componente principal do endomísio*. O colágeno constitui 1-2 por cento do tecido muscular, e é responsável por 6% do peso dos músculos tendinosos. A gelatina, que é usada em alimentos e na indústria, é colágeno que passou pelo processo irreversível de hidrólise.


Acreditando que sabemos agora de que proteína trataremos, vamos para o problema...

* Camada de tecido conjuntivo que encobre uma fibra muscular e é composta principalmente de fibras reticulares, contendo também capilares, nervos e vasos linfáticos. - pt.wikipedia.org


Surge um “novo” argumento por design em cena


Tem surgido a divulgação, por parte de defensores do dito Design Inteligente (D.I.), de que o colágeno no corpo em seus diversos tecidos “mais simples” é de uma forma e quando chega na retina (a velha associação com a complexidade do olho) assume forma em rede e que isso “parece ter sido criado”. Esta argumentação é seguida da divulgação do vídeo abaixo: [Nota 1]




Devemos lembrar primeiramente que os defensores do D.I. não conseguiram sucesso com este tipo de estratégia com a hemoglobina, que é uma proteína mais complexa e de atividades mais específicas, envolvidas com reações químicas fundamentais para diversas formas de vida, e devemos alertar como obteriam sucesso com uma proteína estrutural, e ainda mais alertamos, como iriam tentar “refutar evolução” com uma proteína que está presente até em esponjas, com sua baixíssima diferenciação celular. Para o olho,e deveríamos aqui dizer estruturas relacionadas com a visão, também não obteriam sucesso, pois estas estruturas encontram-se já nos cnidários [Nota 2] , que já apresentam estruturas com estas funções, ainda que não relacionadas evolutivamente com os sistemas de visão dos animais, usemos aqui a própria linha de discursos dos defendores do D.I., ditos “mais complexos”.[Nota 3]


Uma simples consulta em referências triviais já nos mostra que o colágeno ocorre em poríferos:




Ou em cnidários:




Polyorchis pencillatus, já com as estruturas vermelhas que são sensórias à luz - tutorvista.com


Existiria aqui uma afirmação por parte dos defensores do DI de que o colágeno naquela posição/função contrariaria sua estrutura tridimensional mais comum, “normal”.


A formação de estruturas terciárias e quaternárias do colágeno similares as de todos os cordados - leia-se “incluindo os humanos - já se dá nos peixes, e só isso, já basta para sustentar evolução, ou melhor, não refutar o processo evolutivo - especiação, ancestralidade comum, “macroevolução”, etc. Para entender-se a banalidade disto, basta se observar seus olhos, no fundamental, em coisa alguma diferentes dos nossos, porém, em concordância com o processo evolutivo, diferentes dos olhos dos moluscos e dos artrópodes, os três designs básicos das formas de vida animal ainda existentes na Terra, ainda vivos, “superiores” (perceba-se as aspas) aos vermes.[Ver Anexos]


Anatomia do olho de um peixe, já com todas as estruturas básicas dos olhos dos vertebrados (earthlife.net).


Poderíamos questionar que os defendores do D.I. estão afirmando que uma molécula, uma “afirmado colágeno” teria normalmente mais de um hábito de crescimento, usando um termo da Teoria do Caos, um “gesto”, e que o que determinaria este hábito de crescimento seria uma orientação de “design externo” posterior.


A questão é que há aqui um simplificação grosseira da questão por parte dos defensores do D.I.. Como toda proteína, sua classificação refere-se a uma estruturação básica, praticamente à sua composição e funções, não a uma formulação estrita, que só teria nexo no que tange à moléculas simples .Cada uma das 3 "fitas" de proteínas que é o colágeno são formadas quase inteiramente - destaquemos este inteiramente, mais uma vez, pelo aminoácido glicina (que representa aproximadamente um terço de sua composição/seqüência), restando como outros aminoácidos a prolina e lisina, e mais dois aminoácidos que são modificados após serem colocados pelos ribossomos - os construtores proteicos por excelência, a hidroxiprolina e a hidroxilisina.


A estrutura tripla do colágeno, sua ampliação e um modelo “bolas e varetas” de seção de suas moléculas (editado de cueronet.com).


Desta estruturação, que chamamos como classificatório genericamente de “colágeno”, surgem conformações espaciais, tridimensionais, as mais diversas, com as mais diversas aplicações nos organismos animais, desde as mais básicas, estruturais, como a pele que a todos cordados reveste, até as mais especializadas, como a focada - perceba-se a ironia - pelos D.I.stas, retina.


Assim, não existe “um colágeno”. Existem inúmeros “colágenos”, inúmeros polímeros de aminoácidos com uma determinada composição básica, um jogo combinatório de determinados aminoácidos, construídos com determinados fins, orientados nesta construção pela ação codificadora do DNA.


Observação: Esta ação codificadora do DNA, ocorre em diversos outros casos de proteínas no reino animal, em plena concordância com o processo evolutivo, como no caso das variedades de queratina, alfa e beta, entre as aves e dinos penados, vs demais vertebrados, que não possuem a betaqueratina.[Nota 4]




Estes ”hábitos de crescimento” são determinados por atratividades eletromagnéticas da polimerização, da própria conformação da molécula, pelas nuances de atrações e repulsões proporcionadas pela ordenação dos aminoácidos em jogo. Aqui entra a universal na ação Mecânica Quântica, da conformação por fim dos orbitais dos átomos envolvidos. Nada além da Física.


Só ocorreria um “milagre” - no sentido de fenômeno contrário às leis da natureza - se a proteína assumisse uma forma tridimensional impossível de assumir pelas leis da química (perdão pela nossa redundância aqui necessária).


Esquema da síntese das fibras de colágeno (webs.uvigo.es).


Como deve-se destacar na crítica e refutação ao vídeo de Alexander Tsiaras já apresentada em




Não é mágica, e com certeza não é uma divindade - é química.


Qualquer rápida pesquisa sobre estas estruturações específicas do colágeno já fornece referências de pesquisas e sólidos resultados no campo:




Uma recapitulação de por onde já passamos


1) Temos que o colágeno em si não é argumento contra a evolução.


2) Mostramos que como sua organização no olho já se dá nos filos "acima e incluindo”  peixes (e isto basta) sustentando evolução.


3) A organização em estruturas terciárias e quaternárias também já se dá nos peixes, que possuem retina, córnea e todos os "usos do colágeno".


4) Mostramos que as interações no polímero produz suas estruturações superiores.


Noutras palavras: Se o colágeno forma a retina de peixes, podemos ser, assim como uma foca ou um cavalo, peixes modificados, no que refere-se às nossas retinas.


Logo, apresentar colágeno, uma banal proteína comum entre os animais, ou apresentar que sua estruturação em determinadas conformações em determinada estrutura que compartilhamos com parentes próximos e ancestrais, seja um argumento contra a evolução é um argumento sem nexo, e afirmar que seja evidência da ação de uma força exterior/superior à natureza, apenas aderir a velhos argumentos mais que inúteis e surrados, os argumentos teleológicos.


Os velhos e surrados argumentos do D.I.


Como deve-se sempre destacar, a ocorrência de determinada estrutura, mesmo bioquímica, profunda, irredutível em sua complexidade nos seres vivos não elimina o processo evolutivo, mesmo com a inegável ocorrência de uma ação externa de design, como bem trata Behe, autor mais popular do D.I..


Por outro lado, uma argumentação de complexidade implica em design externo, trata-se apenas de como dizemos, do argumento do relojoeiro de Paley “requentado”, as sempre correlatas à argumentação pelo D.I. da falácia do apelo à ignorância e da argumentação negativa, argumentos refutados à exaustão por H. Allen Orr, Massimo Pigliucci e outros.


Este tipo de argumentação é derrubado pela simples pergunta, implícita na argumentação contra os argumentos teleológicos por Hume:


Como pode-se afirmar que não tenha havido miríades de erros, no caso específico, até a reticulação do colágeno nesta estrutura ter surgido?


O maior problema de qualquer argumento teleológico não é com "evidências disto ou daquilo", e sim com o erro de interpretação basal que Hume fez a todos ver.[Nota 5]


Seleção natural, evidentemente, é o mecanismo de filtro que está como filtro da variabilidade produzida pela sempre instável genética.


Estas questões simples convergem para outra pergunta simples, que deve ser direcionada sempre a quem acha, sabe-se lá com que raciocínio, que evolução seria derrubada como fato, independente de seus mecanismos, pela evidência de ação de um designer:


Sobre qual forma de vida o designer agiu até, neste caso, o "retículo colaginoso" da retina estabelecer-se lá? Existe ou existiu esta forma de vida? Então evolução ocorre!


Lamentamos, mas neste ponto, um Q.E.D..


Assim, pelo conjunto de erros nesta argumentação, agora neste caso específico e mais uma vez improdutivo, repetimos aqui a observação de Orr sobre Behe, lembrando o local do túmulo de Darwin:


Em qualquer caso, sequências de tais contradições comem pelas beiradas no caso de Behe, e, no final, tornam difícil acreditar que Darwin vai ter companhia na Abadia de Westminster em breve.


De maneira similar, podemos afirmar que os mesmos erros, basais e desconexamente crassos, antigos e maquilados de novos, repetidos em nossas terras, ainda que afirmados retumbantemente como “a maior descoberta de todos os tempos”, não colocarão quem quer que seja que pelo mesmo caminho trôpego enverede em qualquer de nossos grandes mausoléus dedicados a nossos heróis, seja em Brasília, qualquer capital ou cidade do interior.


Todo aquele que faz retumbantes afirmações sobre suas descobertas, em ciência, desde sua primeira apresentação, está fadado, ainda sem nenhuma exceção na história da ciência, a se colocar no palco do ridículo dos mais patéticos fiascos, e a causa disto é a não "revisão por seus pares", razão pelo qual a ciência tem se mostrado a vela no escuro cuja luz ainda não pôde (sic) ser de forma nenhuma ofuscada pela chama da fogueira das vaidades.

Notas


1. Alexander Tsiaras não é um cientista, observe-se sua biografia: curiosity.discovery.com - Alexander Tsiaras

2. Para evolução dos “olhos” dos cnidários:

3. Para ver um quadro amplo da evolução do olho em vários filos, recomendamos:



4. Recomendamos, para entender a questão da queratina na evolução de aves a partir de dinos, o texto de Silvia Gobbo, editado e comentado por Francisco Quiumento:




5. Para os erros da argumentação teleológica, apontados por Hume, basta ler a trivial Wikipédia:




Anexos


1. Quadro geral da evolução das estruturas visuais, com destaque para a evolução do olho dos cnidários: