quarta-feira, 8 de julho de 2009

Matemática e Empirismo



Retornando ao tema lançado na postagem anterior sobre o que nasce (e na verdade já era gestado há muito em Filosofia) em Byron, recentemente, "batendo boca" com mais um dos personagens mais que perdidos que abundam em perfis falsos pelo ORKUT e outras redes de relacionamento debatendo com soberba quase incontrolável conhecimentos formais que não possuem, e infelizmente pelo lado errado e falso da argumentação, quando não em conceitos completamente obscuros do que realmente seja a base do que defendem, enfrentei mais uma vez a afirmação que Matemática seja Ciência (e aqui tratarei a questão longamente), e sobre esta possa se construir, assim como pela lógica pura, um entendimento do mundo, ou uma Física, quando não, uma Metafísica.

Primeiramente, uma sentença até autoritária, depois a justifiquemos:


Matemática é linguagem lógica sobre axiomas, não é ciência no sentido popperiano, logo, não
pode ser empírica.

Dentro disto, temos de definir o que seja uma tal ciência popperiana, que é aquela ciência que ao observar um fenômeno, seja ele qual for, formula para ele uma hipótese, e a testa para tentar falseá-la (daí o termo falseabilidade, ou falseamento, jargões do ramo), e se esta hipótese sobrevive, constrói sobre ela uma teoria, formada até por novas hipóteses, mais detalhadas, abrangentes ou derivadas, em temas mais específicos ou para variações específicas do fenômeno original.


Um tratamento sobre isto e a definição de demarcação, que é outro conceito de Popper, está no meu Knol sobre o tema.

Logo, uma ciência popperiana, como são as ciências naturais, como a biologia ou a geologia, são ciências que não afirmam aquilo que é, mas aquilo que jamais se evidenciou diferente.


Este empirismo, de submeter as afirmações científicas ao permanente "flagelo do teste", e com esta sobrevivência aproximar-se daquilo que seja a "verdade", é o que é formulado pela primeira vez num discurso filosófico formal em Byron, e tratado a novos níveis em Popper (e notemos as aspas em verdade, pois jamais em ciência se trata do que seja a verdade no sentido filosófico, e sim, somente o evidenciável, as nossas impressões sobre o mundo e os modelos de tal comportamento que sejam confiáveis, visto que sobrevivem às observações, ao seu falseamento e esta é a idéia principal do pensamento científico, de sua lógica, desde Popper).

Voltando, claro que existem campos da matemática que são empíricos, como campos em que as conjecturas matemáticas ainda não são transformadas por demonstração em teoremas ou campos em que a formalização até mesmo de linguagem ainda não seja desenvolvida, e pode-se estabelecer "testes", para chegar-se a determinados resultados. As modelagens que se faz em diversos campos da engenharia, desde o projeto de estruturas até o planejamento logístico estão repletos de empirismos em matemática, lógico que aqui uma matemática aplicada, mas isto não é o que propriamente seja matemática, que está na verdade, pouco se lixando para o que seja a realidade, como do que é feita intimamente a matéria ou como é dimensionado o mundo, tanto em medida quanto em partição e até mesmo em dimensões.


Exemplificando: pouco interessa que o mundo tenha três claras dimensões de espaço e uma de tempo. A matemática pura nem se interessa pelo que seja um metro, nem trata do que seja tempo e tampouco nela impede-se que um "cubo exótico e especial" tenha dezoito dimensões, todas elas formando ângulos retos e ser cortado neste espaço por um conjunto de espaços euclidianos de três dimensões em quatro partes iguais.

Retornando a questão empírica em matemática, e nem usando de um contra-exemplo tão radical assim, qual seria, após uma demonstração inequívoca, o sentido de se submeter à falseamento a "hipótese" de que a soma dos quadrados dos catetos é igual ao quadrado da hipotenusa, se uma demonstração geométrica em duas dimensões o comprova agora e para todo o sempre?

Assim, quando Pitágoras demonstra o teorema que leva seu nome, ou Wiles demonstra inequivocamente (aliás, afirmar isto em matemática é uma redundância desnecessária) a adequadamente chamada conjectura de Fermat, chamado durante três séculos de "Último Teorema de Fermat", nunca mais alguém vai necessitar testar novamente tais demonstrações. E se após uma apresentação de novas demonstrações, com uma sombra de dúvida, posteriormente se apresentar um erro nestas, como houve numa primeira demonstração de Wiles, que apresentou um sutil deslize (o que invalidava sua demonstração, não uma imprecisão, como em Física), esta precisa ser ou refeita ou abandonada, mas não se necessita testá-la no sentido empírico.

Um exemplo para diferenciar isto do que seja a Física e suas afirmações, é bom saber que o raciocínio do afastamento das galáxias determinado por Hubble está mais que correto, e tais são os fatos, mas suas primeiras determinações da idade do universo apontavam para uma idade que seria metade da já conhecida idade da Terra, o que seria um absurdo, mas tal não é uma demonstração errônea, e sim, um fruto de imprecisão, oriunda dos instrumentos de medida e das premissas que se tomava sobre eles.

Aqui, é interessante se saber que a medida que a matemática avança ao longo da história, mais e mais sofisticadas são as demonstrações, com uma clara tendência para serem mais complexas, ao ponto de demonstrações simples e diretas, cristalinas e a partir de raciocínios simples, mas jamais simplórios, como o são a demonstração de Pitágoras para a relação entre os lados dos triângulos retângulos, ou a infinitude dos números, por Euclides, ou a irracionalidade da raiz quadrada do número dois, quase uma demonstração maldita entre os pitagóricos, conforme reza a lenda, atribuida a Hipaso de Metaponto, verbete simples de minha autoria que muito me orgulha na Wikipédia.

Para entender estas e outras questões, recomendo boa parte de "O Último Teorema de Fermat", de Simon Singh. Um companheiro nesta luta pelo entendimento do que realmente seja a matemática "pura", Fernando Farias, com formação em matemática, apresentou referência dos livros "O que é a matemática?" de Richard Courant ou "A janela de Euclides" de Leonard Mlodinow, para um entendimento do realmente tratamos quando se diz matemática, e eu acrescentaria uma mínima passada de olhos sobre "Principia Mathematica", de Bertrand Russell e
Alfred North Whitehead, para se ter uma idéia da imensa dificuldade que é expressar-se os fundamentos mais básicos do que seja, por exemplo, um número, seja ele "o mísero" UM.
Bertrand Russell

O verbete da Wiki sobre esta obra, em espanhol, assim como em inglês, liga o artigo a este livro em sua versão em inglês, pela Universidade de Michigan.


Aqui surge um enigma que tem perturbado os cientistas de todos os períodos. Como é possível que a matemática, um produto do pensamento humano, que é independente da experiência, se encaixa tão perfeitamente os objetos da realidade física? Pode a razão humana, sem a experiência, descobrir por puro pensamento as propriedades de coisas? - Albert Einstein, 1921.

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