quarta-feira, 4 de maio de 2011

Aliens (ou vida extraterrestre) I

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Como a maior parte das pessoas hoje (digamos claramente: jovens) não são muito afeitos a ler ficção científica mas muito a assistir filmes, tratarei neste artigo do tema em torno de filmes, e aqui e ali, uns pingos de literatura da área.


Os arquétipos


Viajantes microscópicos



A ficção científica já colocou formas de vida no espaço interestelar e interplanetário, destacadamente a microscópica, como em Enigma de Andrômeda.

Confesso que não sou muito simpático a esta ideia. O espaço é permeado de radiações ionizantes, até as mais intensas, que são os raios cósmicos. A própria química interesterlar/interplanetária é bastante dinâmica pela ação dos raios ultravioleta, raios X e raios gama, sem falar das partículas aceleradas, modificando até mesmo a composição em átomos (por alterações dos núcleos atômicos) constantemente.

No filme (a minissérie de TV, apesar da esmagadora capacidade de produção em efeitos especiais de hoje, é um desastre ecologistóide/viagens no tempo completo) a forma de vida é capaz inclusive de transformar energia de uma explosão nuclear em sua fonte de energia bioquímica, o que me revela que o roteirista e outros não alertaram Michael Crichton de que energia de partículas e temperatura permitem apenas determinados estados (fases, como preferimos mais tecnicamente) da matéria. Assim, a superfície do Sol e até mesmo determinadas profundidades de Júpiter, por exemplo, não permitem determinado tamanho de moléculas complexas, e até mesmo, nem mesmo uma única molécula, e ao se chegar a determinada temperatura não teríamos nem mesmo átomos íntegros. Explosões nucleares de fissão vitrificam solos e volatilizam ossos, que são na sua parte inorgânica, em termos de engenharia, um material refratário.

Neste ponto, a criatura "programa" de Vírus, a produção "terrorzenta" de 1999, me parece mais plausível, ainda que a dissipação por ruído e pelas próprias leis da Mecânica Quântica (que impedem inclusive determinada segurança em podermos nos comunicar por rádio com civilizações extraterrestres) me leva a ter confiança em que tal tipo de ser vivo ou comunicação (ou ataque!) não seja possível.

Apesar desta, usemos meus termos, 'imensa babada', a cena do pulso cortado e liberando poeira de sangue coagulado cristalizado é inesquecível, e tal metabolismo não seria um absurdo.

Mas esquecendo que a pobre coitada forma de vida advinda do espaço teria (se sobrevivesse as incandescentes temperaturas de entrada na nossa atmosfera) de enfrentar bilhões de anos de evolução de bactérias que foram capazes de digerir tudo, desde óxidos de ferro e sulfato, passando, evidentemente, por celulose de belas plantas floridas e até a pele, musculatura, pulmões e ossos desde peixes até macacos pelados munidos de poderosa (e nem tanto) tecnologia médica. Noutras palavras: mesmo dizimando todas as formas de vida mais complexas de nosso planeta, teriam de enfrentar as mais simples. Deixemos os imprudentes aliens de Guerra dos Mundos para adiante e lembremos, e no futuro talvez até tratemos, que somos as formas mais simples modificadas, e fomos (nós, os complexos) mais extintos por climas, vulcões, eras glaciais e impactos meteoríticos de que pelas terríveis bactérias que dissolveriam o mais resistente organismo do espaço (sem falar nos vírus, que até atacam as bactérias).

Obs.: Devo alertar que vírus (os terrestres!) são os parasitas por excelência, pois só se repoduzem pelos mecanismos de produção de genética alheios, e portanto, para serem algo - em uma forma similar - a nos atacar, teriam de ter se desenvolvido em algo que fosse a nossa genética, e tal é uma enorme impossibilidade, da mesma maneira que o vírus letal para um cão, um gato ou uma galinha não necessariamente é letal para um humano, e muitos não são letais nem de um destes animais para os outros, quanto mais levando em conta toda a diversidade de vida na Terra. Tanto isto é fato que se pesquisa vírus bacteriófagos, que são moléstias para bactérias, para aplicação em medicina e veterinária.


Um vírus bacteriófago (www.portalsaofrancisco.com.br).


Mas uma forma de vida encistada, "bacteriana" (no sentido de química simples e básica) poderia chegar a distantes pontos de seus mundos de origem inseridas em corpos celestes blindados por sua própria configuração e dimensões às radiações e temperaturas de entrada. Sua partida seria causada por impactos, como na Terra chegaram pedaços de Marte oriundo de impactos no planeta vermelho. A meu ver, aqui, o problema seria, nas distâncias interestelares, uma bioquímica que fosse estável pelos gigantescos períodos de tempo que seriam necessários para distâncias de anos-luz serem vencidas por velocidades de dezenas de quilômetros por segundo, quanto muito, e contar-se com a sorte de chegarem a algum sistema solar, orbitarem por talvez milhões de anos antes de se precipitarem num mundo agradável, e não serem absorvidos pelas imensas gravidades dos gigantes gasosos (obrigado por nos proteger, Júpiter "O Gordo"!), não colidirem com alta velocidade com um corpo impropício à vida e na colisão, enfrentarem fragmentação de sua "cápsula" ou temperaturas de calcinação, sem falar nas estrelas, que são as senhoras absolutas da absorção de corpos nos sistemas planetários, e fonte de grande parte da radiação que impediria tal fenômeno.


Insetos vorazes


Agora falemos de formas de vida mais complexas, que surgiriam num processo evolutivo não porque a vida busca a complexidade, mas porque a complexidade surge em um processo estocástico pelo simples erro, que produz distribuições.

Tratei disto em:

Modelos Matemáticos Simples em Evolução - II - O aumento da complexidade do ponto de vista de combinações possíveis

Lembrando que no Cambriano chegamos a ter dezenas de designs básicos, dos quais sobreviveram apenas entre os mais complexos os cordados (um bacalhau, um elefante e você), os moluscos (lesmas, caracóis e os inteligentíssimos polvos e lulas em suas diversas variações) e os artrópodes (desde os tatuzinhos de jardim, os caranguejos e para desespero de alguma leitora, até as baratas), podemos então supor que num planeta propício, lá também pelos 3 bilhões de anos de existência da vida, surgiriam designs variados, exatamente em acordo com os mesmo princípios e mecanismos que levaram o nosso planeta a ter mais originalidade nos designs básicos que possui hoje (na verdade, nos últimos trezentos a quatrocentos milhões de anos).

A fauna do Cambriano (uua.cn).


Assim, neste planeta, poderiam os "artrópodes de lá" passar a desenvolver pulmões (ou algo parecido, diferente dos túbulos funcionando por capilaridade de nossas baratas), e atingir tamanho acima dos três metros que no máximo chegaram os nossos (desprezemos aqui questões gravitacionais) ou passar a desenvolver um esqueleto interno, sustentando o relativamente grande corpo em posições mais verticalizadas (coisa, que até o momento, nossa paleontologia jamais encontrou - as maiores lacraias da história e os maiores escorpiões marinhos nunca conseguiram a posição elevada de uma mísera galinha, quanto mais de um dinossauro, nem mesmo de um de nossos quadrúpedes domésticos).

Claro que este preâmbulo foi para citar o mais assustador dos alienígenas do cinema, aliás, que levou o termo alienígena a ser praticamente um sinônimo de extraterrestre: a criatura de Alien, o Oitavo Passageiro. Um das características sensacionais desenvolvidas a partir do episódio 3, meu segundo na ordem de preferência, é a sua capacidade de incorporar a genética do ser parasitado na sua reprodução (neste filme, a criatura é mais próxima em postura de um cão que de um humano) e já nos péssimos "Alien x Predador", absorve até a estrutura bucal do caçador "rastafari" do espaço. Descobrimos que bactérias - terrestres, fique bem claro! - possuem tal capacidade em determinado nível.

Vide "Transformação":

Mecanismos devariabilidade genética em agentes fitopatogênicos - www.fcav.unesp.br

Quanto a aspecto muito criativo de seu sangue ser corrosivo, há insetos produtores de substâncias cáusticas,  como a pederina dos potós (Paederus irritans) e os produtores de misturas termogênicas, como o antigamente tão citado pelos criacionistas besouro-bombardeiro (Brachynus crepitans), mas da mesma maneira que o mercúrio nos é tóxico, o cobre, o zinco em determinadas taxas, o cádmio, o chumbo, o arsênio, etc, talvez alienígenas não possam nem se aproximar de nosso sangue com sua hemoglobina contendo ferro, o cálcio e o fósforo de nossos ossos, e até do teor de salinidade de todos nossos fluidos. Talvez nossa urina, contendo nitrados, seja causador de terríveis queimaduras em algum et que nos pretenda como refeição. Mas não me venham citar que alienígenas seriam queimados por água potável, quando nossa atmosfera é sempre cheia de vapor d'água, como em Sinais, pois os furos de roteiro daquele senhor me irritam há anos.

Paederus irritans e Brachynus crepitans, dois pequenos seres, capazes de produzir respectivamente causticidade e líquidos quentes.


Mas já criamos no terreno da ficção oceanos vivos (Solaris), algo parecido com um fungo (o pólipo de A Cidade e As Estrelas, romance de A.C. Clarke), uma "amebona" nos dois A Bolha Assassina e até gigantescos cristais no - diria primitivo, não ruim - The Monolith Monsters/Rastros do Espaço, e mais recentemente, mais e mais formas de vida bastante distantes do que temos em nosso planeta, em toda a sua história, vide os até divertidos docufiction, como Alien Planet, da Discovery Channel, e outros similares da THC e NatGeo, aqui já com um tratamento cientificista e didático, que nos poupa, inclusive, de assistir formas de vida saltando do tórax de seus hospedeiros em plena refeição.

Na verdade, não haveria limites para o que um processo de arranjo de células (se células), completamente estocástico, poderia fazer em sua estruturação, as conformações que seriam possíveis, ao longo de milhões de anos. Já basta ver no nosso quintal, mesmo entre os limitados em tamanho insetos, suas miríades de formas (na verdade, basta você olhar para seu prato de comida, pois devo lembrá-lo, leitor, que é primo muito distante não só da galinha ou da vaca, mas também do pé de alface que come).


Pelo menos a computação gráfica e a qualidade dos consultores dos grandes orçamentos dos filmes de ficção nos poupa de assistir brócolis de dois metros de altura correndo atrás de moças em trajes de banho dos desastrados filmes de ficção-terror dos anos 50 e 60, embora em alguns momentos, vagens gigantes tenham produzido razoáveis histórias, como nos vários "Invasores de Corpos", e até simpáticos personagens que possuiam as características das plantas de fazer fotossíntese e ficarem felizes com a luz de estrelas, como a belíssima Virginia Hey, no papel de Pa'u Zotoh Zhaan, na série 'modernosa' mas sofrível Farscape, mas tratarei de seres inteligentes/civilizados adiante. Na própria Terra, devemos lembrar, temos uma lesma, a Elysia chlorotica, que por absorção dos genes da provenientes da alga que come, a Vaucheria litorea, disso se aproxima.

Elysia chlorotica (meubioblog.blogspot.com).


Mas antes de seguirmos, até porque o citarei de novo, dentro do gênero scifi-terror, tenho de citar Enigma de Outro Mundo (The Thing, 1982), refilmagem de um dos B relativamente sérios dos anos 50 (O Monstro do Ártico/The Thing from Another World, 1951), de John Carpenter, onde a criatura não é amorfa no sentido de uma gosma, como a bolha antes citada, mas sem forma no sentido que vai copiando as formas de vida as quais contamina e absorve. 


Civilizações

Sou obrigado a confessar (dado alguns céticos mais radicais, tenho de dizer isso) que guardo muito carinho por dois filmes sobre extraterrestres, ET e Contatos Imediatos do Terceiro Grau, ambos dirigidos por Spielberg, e outro tanto por Starman, de1984, de John Carpenter. Suas mensagens são positivas, tem um tom quase piegas de esperança, bondade, etc, e apresenta os seres humanos sempre no papel dos piores personagens. No mesmo campo, podemos incluir também O Dia Em Que A Terra Parou, neste campo, apesar das diferenças do que chamaria até de "ingenuidade biológica" do primeiro, contra a falta na verdade de uma mensagem mais elaborada no segundo (para que raios precisam os seres de uma aliança de civilizações avançadíssimas exterminar uma espécie e suas obras, se pode forçá-las pela eminente destruição a salvar todas as outras e ainda obterem baratíssimos "jardineiros"? exatamente o argumento do primeiro - mas tratarei este filme mais longamente noutro artigo).

Percebamos que com exceção de Starman, e o segundo O Dia Em Que A Terra Parou, no qual é dito inclusive "assumi esta forma pois a minha verdadeira lhe seria repulsiva" (ou frase similar), que são mantidas como um mistério, ou ainda de Contato, da qual só se vê algo como uma lula ou medusa flutuante distorcida por uma parede de projeção do ambiente criado para ser agradável à Dra Eleanor Arroway em sua jornada, as formas de vida de ET e 'Contatos' são na verdade, humanizadas e mesmo no caso de ET, que podemos afirmar como uma "criança deformada por um software de tratamento de imagem", ainda mantém uma disposição de órgãos e parte do corpo de um humano e seus parentes mais próximos.

Gosto de Inimigo Meu, de 1985, o qual também colocaria no terreno das grandes mensagens morais dos filmes de ficção científica, com uma via um tanto inversa de Distrito 9 (neste blog), pois onde o segundo mostra que mesmo os brancos odiando os negros e vice versa, ainda mais odeiam quem seja de outra espécie, e em determinado momento de Inimigo Meu, é preferível salvar um ser com quem eu possa conversar, ainda que o considere feio, do que ter de enfrentar sozinho um predador que julgue mais feio ainda. Mas ainda sim o sábio Jeriba Shigan, capaz de se reproduzir sozinho, esfrega na cara de nós, macacos pelados, que temos a triste realidade de termos de nos completar para perpetuar nossa espécie (ainda que espere a clemência de algum biólogo, pois sei bem que a reprodução sexuada é o que permite ser ainda mais rápida a evolução e a formação, nesta, de populações mais aptas ao meio, o que aliás, já tinha sido observado por vias ainda sem a genética por Darwin, em A Origem das Espécies).

Basta resumirmos que se os decendentes da "explosão do Cambriano" de cada um dos mundos que permitiu vida (digo 'permitiu' pois defendo que vida não é uma raridade, e sim um produto inexorável da química e da astrofísica/exo-geologia) permitiu um conjunto de designs básicos diversos para seus animais mais complexos (ou animais-plantas, ou fungo-animais, ou qualquer coisa possível no biológico, desde que se mova e possua características que lhe levem a ter um "operador sensorial e lógico"), da mesma maneira que entre nós sobreviveram o conjunto cordados-moluscos-artrópodes, qualquer forma seria possível, e o cenário mais adequado para mostrar-se isso seria o das inúmeras criaturas do cômico mundo imaginado em Men In Black.

Talvez nada mais chocante para a humanidade que sair de uma nave pousada numa grande praça de alguma grande cidade do planeta algo parecido com uma lagosta, um louva-a-deus, uma lula ou ainda algo que lembre um centauro ou um elefante com uma muito mais hábil tromba (ou duas, três ou quatro trombas), que possua escamas ou penas, ou ainda outro exótico revestimento corpóreo, olhos de calcita, como tiveram nossos trilobitas, e que sejam mais, do ponto de vista do que realmente devemos classificar como o humano enquanto mental e social, mais humano que nós, e após ver nossa surpresa, nos alerte queo relojoeiro não só é cego, mas odeia repetir suas criações.

Um design básico perfeitamente possível para um extraterrestre (no.comunidades.net).


Mas quero abordar outro ponto, não ficar na biologia pura e simples. Mas já que temos que para isso colocar vida, provavelmente a partir da evolução de bactérias ou seres simples similares, temos de tratar de seu substrato.

Pa'u Zotoh Zhaan, única imagem de ficção desta blogagem, pois Virginia Hey merece.



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3 comentários:

Anônimo disse...

Magnífico!
Essa postagens ficou muito legal, gostei muito.
Acho seu Blog muito interessante, ele aborda temas pela qual me interesso bastante.
Parabéns,
Boa semana.

Anônimo disse...

Adorei sua explanação!!!A muito tempo ñ via alguem falar com tanta sobriedade sobre este assunto que atiça ñ só a curiosidade como tambem os mais loucos delirios de muitos!!!parabens!!!mirele

ISAIAS OLIVEIRA disse...

Muito boa esta postagem. Ainda mais para mim, um voraz consumidor de Ficção Científica em todas as suas formas, principalmente a escrita de Clarke e Asimov.

Falando em clarke, um dos livros que mais me prendeu foi Encontro com Rama. A nave-mundo, as relações físicas, a atmosfera e os Biômatos.

Seria possível que em algum momento você falasse um pouco dessa obra?

Abraço.