domingo, 13 de novembro de 2011

De Criacionistas a Einstein

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Ou "como existem pessoas que tem dificuldade em aceitar o mundo como ele é".


Há algum tempo, nas "plagas orkutianas", encontrei um criacionista (sim, lá eles ainda abundam!) que tinha - e certamente ainda deve ter - uma certa relutância em entender a naturalidade de uma notícia recentemente divulgada sobre fósseis que ficaram expostos com uma seca na Argentina.

Ele argumentava - se é que dá para dizer que criacionistas fazem isto - que não seria muito coerente o que a notícia afirmava que fósseis entre 10 mil e 1 milhão de anos ficaram expostos, pois se eram no mesmo leito do rio, na mesma camada de sentimentos, deveriam ser todos da mesma idade.

Claro que o objetivo por trás disto é aquela velha lenga-lenga de Terra Jovem, 6000 anos, Dilúvio Universal, "todos os animais mortos ao mesmo tempo", etc.



Prontamente respondi, sem grande esforço, nem de pesquisa nem de "imaginação".

Recentemente encontrei outro que apaixonou-se pelos "argumentos de erosão" (um ex.), em especial, que se a "erosão ocorre a determinada taxa, a altura do Everest aponta para ele ter uma determinada idade". Sim, pasmem! Algo tão "brilhante" quanto dizer que como costumo cortar minhas unhas 1 mm de cada vez, a cada 7 dias, estas determinam que pelo seu comprimento, no "mindinho" de mais ou menos 1,1 cm, tendo anteriormente 1,2 cm, eu não possa ter de idade mais que esta última semana![Nota 1]

Respondamos agora, rapidamente, que a questão maior entre os criacionistas (e outros personagens similares) a respeito deste tipo de argumentação infeliz por "Terra Jovem" relaciona-se com uma certa dificuldade de entender a Terra e sua geologia como um processo constante, embora, no seu "motor" mais profundo, imperceptível aos olhos humanos diretamente.

Explico: percebemos um vulcão em atividade, da mesma maneira banal que percebemos um carro em movimento, ou mesmo, a gavinha de uma trepadeira crescendo, dia após dia. Mas temos uma certa dificuldade para entender (na média das mentes humanas, por favor, estudioso e preparado leitor!) continentes inteiros movendo-se na mesma velocidade que nossas unhas crescem.[Nota 1]

Excelente representação artística de Leandro Sanches da Costa de um dos animais do passado do Rio Grande do Sul (leandrosanchesarte.blogspot.com)



Deste modo, é difícil para a cabecinha (sim, isso mesmo, na ofensa) criacionista de "Terra Jovem" aceitar que a geologia, os tectonismos, permitem que um mastodonte enterrado na fronteira do Uruguai com a Argentina hoje possa vir a, num "dobramento", ficar numa camada acima da onde meu esqueleto tenha sido enterrado, mesmo que milhões de anos depois, ainda mais num futuro de 100 milhões de anos de agora, tempo este menor que aquele que nos separa de certos amniotas de minha terra natal, soterrados por derramamentos vulcânicos colossais, que soterraram parcialmente imensa planície, formando a hoje bela Serra Gaúcha.[Nota 2]

www.earthsci.unibe.ch


Estas acumulações (as vezes de resíduos em baixios) mais as erosões de variantes no tempo rios, levam a similares a antiquíssimos (ou muito mais) mastodontes aparecerem com fósseis (que podem ter sido para lá também arrastados, variante que ainda não tínhamos colocado) de répteis dezenas de milhões de anos mais antigos, e estes, reunido, entremeados com molusco de centenas de milhões de anos de idade.[Nota 3]

www.earthsci.unibe.ch

Estas fraturas e dobramentos, que outrora foram atribuídas aos catastrofismos, especialmente o "Dilúvio Universal Bíblico", são o que permitem ainda mais ininteligíveis à mente criacionista inclinações de leitos marinhos inteiros, agora face de montanhas, como as que abrigam os fósseis da fauna magnífica em designs básicos do Cambriano, nas montanha do Canadá.

Um amonite dos alpes franceses (fossilspictures.wordpress.com).



Em suma, nada tem de ser o mundinho pacífico e de poucos acontecimentos rápidos, e de lentos movimentos imperceptíveis, dos criacionistas de "Terra Jovem". Por isso que lhes é tão difícil entender que conchas no alto do Himalaia não são restos do Dilúvio, colocados lá pela baixa das águas, e sim, fundo de mares, erguidos aquelas alturas por milhões de anos de movimentos de placas de milhares de quilômetros quadrados e de dezenas de quilômetros de espessura.

www.earthsci.unibe.ch


Mas não dá para se exigir muito de mentes que acham que suas mães são descendentes de costelas de certo senhor moldado do barro por um fantasmão providente, indeciso, volta e meia arrependido, seguidamente homicida, e que não ajudava seu povo preferido quando este enfrentava na guerra povos com carros (de ferro, sejamos tolerantes com o todo poderoso deus dos judeus e derivados).[Nota 4]

The Burgess Shale (records.viu.ca).


Coisa alguma em Paleontologia e Geologia necessita ser a harmonia de evidências infantilmente simples que exigem os criacionistas.



Na profundidade do inconsciente humano, existe uma necessidade de um universo lógico, que faça sentido. Mas o universo real está sempre um passo adiante da lógica. - de Citações Reunidas do Muad'Dib, escrito pela Princesa Irulan - Duna, de Frank Herbert.


Para um boa leitura sobre a - podemos dizer violenta - formação e comportamentos das grandes cadeias de montanhas do planeta:
http://en.wikipedia.org/wiki/Geology_of_the_Himalaya

http://en.wikipedia.org/wiki/Geology_of_the_Alps

http://en.wikipedia.org/wiki/Geology_of_the_Andes#Geology

Em especial, sobre os "dobramentos" nos Alpes:

http://www.geo.arizona.edu/geo5xx/geo527/Alps/geology1.html


Já em passagem por uma comunidade de Astronomia, encontrei-me com um dos dedicados criacionistas que se dedicam a discutir a "veracidade" do Big Bang com argumentos mistos de Física de secundário (e ainda por cima das piores) e argumentos teleológicos (vide meu artigo sobre o Argumento do Relojoeiro de Paley) o que sejam os fundamentos da cosmologia. Neste "debate", enveredamos eu e outro participante, já com o criacionista há páginas em fuga, o velho "toca pedra e corre", sobre a dificuldade de aceitação de determinados comportamentos da natureza tal como ela é, inclusive por Einstein, e dogmas que regem os pensamentos de até mesmo pensadores extremamente dotados como o grande físico.

No caso de Einstein a questão maior foi a aleatoriedade, o acaso (tratei disso em Einstein, a relutância contra a Mecânica Quântica e outras "fisiquices").

O que me impressiona é a quantidade de pessoas que insistem de maneira quase desesperada em aceitar o indeterminismo (até mesmo o do nosso entendimento/modelagem do mundo - a aleatoriedade subjetiva) e insistir numa natureza profunda determinista da natureza (contrário à uma aleatoriedade objetiva). Mal pecebem que ao agarrarem-se a isto com suas primatas unhas e dente, negam exatamente a liberdade que afirmam (o seu "lívre-arbítrio) ou condenam seu fantasmão providente a ser o autômato preso às próprias primeiríssimas decisões/desígnios, sem jamais poder alterar o mundo como o seja.

Ora, se afirmam que seu fantasmão providente altera o mundo no macro, como por exemplo, extirpando um câncer de seus filhinhos (embora não podendo devolver-lhe uma simples ponta de dedo!) não aceitam que ele poss operar mudando a direção de um simples elétron "aleatoriamente aos nossos olhos", mudando a trajetória de um simples dado.

Repete-se aqui, similarmente, noutra escala, o fenômeno de não conseguir aceitar os fenômenos da velocidade do crescimento de uma unha, agora, em um tiro no próprio pé da teologia primária.

Resumamos o nosso argumento:

1.Se não existe aleatoriedade alguma na natureza, todos os eventos são determináveis.
2.Se só existe determinismo, toda a história do mundo, desde seu princípio mais remoto, está cristalizada num determinismo.
3.1.Se todos os fatos estão cristalizados em uma história determinada, não existe liberdade (logo, livre-arbítrio é contraditório com determinismo).
3.2.Se todos os fatos estão cristalizados em uma história determinada, não existe milagre algum, pois a divindade não pode modificar o que já designou (considerando, obviamente, que ela exista, mesmo numa posição teísta mais elaborada).
4.Se existe o milagre no macro, como a cura de um câncer, obviamente passa a ser possível o milagre no micro, e tal seria correlato com a aleatoriedade, como temos no quântico.
5.De 4, temos que a aleatoriedade, mesmo na ótica teísta, é inerente à natureza e concordante com a alegada liberdade que temos.

Acho que isto foi um Q.E.D..

Como dizemos a quem nega a aleatoriedade: Jogue um dado!

A irracionalidade de uma coisa não é argumento contra sua existência, mas sim uma condição dela. - Nietzsche


Notas


1. A velocidade média de crescimento é de 1cm a cada 3 meses (3,3 mm por mês; 4 cm por ano) para as unhas da mão e metade desta velocidade para as unhas do pé. - www.gustavoalonso.com.br

Falando em crescimento das unhas, para irritar mais um pouco "nossos amigos" criacionistas e fixistas, que volta e meia chegam ao disparate de afirmar que um cavalo, por exemplo, no passado, não pode ter sido do tamanho de um chachorro (especiações, mutações, etc, fora, aqui, por favor), nem que você faça um pônei argentino de 50 cm de altura escoiceá-lo:



KERI SUTHERLAND; Why your nails are growing 25 per cent faster than your grandparents' did - www.dailymail.co.uk

2. Algumas leituras com referências sobre a fauna de minha terra (quando na verdade, ela nem ficava onde está):
     b) www.cprm.gov.br
     c) www.mapress.com

planta.cn
3. Um corte da bacia sedimentar do Paraná. Milhões de anos de erosão levaram a centenas de metros de deposição de sedimento:

altamontanha.com
Para ler sobre os diversos processos que formaram a Serra do Mar e no que ela relaciona-se com a profunda acumulação que é a bacia do Paraná, em texto muito didático:

Pedro Hauck; Origens e evolução da Serra do Mar

4. Juizes 1:19 "Esteve o Senhor com Judá, e este despovoou as montanhas; porém não expulsou os moradores do vale, porquanto tinham carros de ferro." - sdblisboa.com


Recomendação de leitura

Com a palavra, um mestre, traduzido por uma pessoa que muito tem se dedicado à tradução e divulgação de textos clássicos na questão religião* vs ciência.

Nada em Biologia Faz Sentido Exceto à Luz da Evolução; Theodosius Dobzhansky (1900-1975)

*Aqui leia-se criacionismo.


Quando começa a existir para os outros, o pensamento é como o filho que se desliga da mãe ao iniciar a própria existência. Schopenhauer



Extras

I

Pré-Sal 1

Tamanho das reservas

Ainda não se conhecem com exatidão o tamanho das reservas tratados como "pré-sal" sob as águas brasileiras. As estimativas situam-se numa faixa de 40 bilhões a 80 bilhões de barris. As avaliações divulgadas são apenas as que englobam as principais áreas que já passaram por processo de licitação: campos de Tupi e Iara, na Bacia de Santos, e Parque das Baleias, na Bacia de Campos. Nessas três regiões as estimativas atingem 14 bilhões de barris, valor suficiente para tornar as reservas conhecidas do Brasil o dobro das de até então. Perfurações posteriores a estas em novos poços e conclusão de testes para quantificar as reservas de Guará já elevarão provavelmente estas reservas. Fator mais importante que apenas a quantificação das jazidas é  determinação de sua viabilidade comercial, o ser extraído com custos viáveis. As estimativas da Petrobras apontam para um sucesso na faixa de 87% dos poços perfurados, ainda que outras companhias tem apontado a descoberta de poços não viavelmente produtivos.

Em breve, texto a ser lançado no meu Knol sobre o tema: Petróleo Pré-Sal

II



Spud Raincoat, uma capa de chuva produzida na Espanha, a partir de um bioplástico de tecnologia alemã feito de amido de batata e outros recursos naturais, biodegradável e compostável. - super.abril.com.br
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