(para muitas pessoas)
De um comentário num chat de uma live, há 9 anos, algo muito típico:
“Com certeza o Universo não tem só 13,7 bilhões de anos… não é preciso ser cientista para ver isto. Isto é só para tentar encobrir a falácia da teoria da evolução. O Universo é infinito em tempo e tamanho.”
Ah, a necessidade quase doentia de acreditar, e não a nobre sublimação, entender e aceitar… [Nota 1]
Observem que a frase contém erros em camadas, pois o universo ser mais velho em coisa alguma conduz à uma conclusão de que a evolução dos seres vivos não ocorra, sequer alteraria na verdade a idade da Terra. Mas vamos aos pontos que interessam em se tratando da idade do universo.
Gemini da Google e Francisco Quiumento
A Sedução do Infinito e a Resistência aos Números Finitos
A cosmologia moderna, com seus números gigantescos, mas finitos, choca-se frequentemente com uma intuição humana que prefere o conforto do infinito e do eterno. A afirmação de que "o Universo é infinito em tempo e tamanho" é, de fato, menos uma hipótese científica e mais uma declaração de fé. Ela nega, em uma única frase, décadas de observações empíricas e o arcabouço teórico que as sustenta.
Por que essa resistência ao número 13,7 ou 13,8 bilhões de anos?
O Desafio à Intuição: A vastidão do tempo cósmico é incompreensível na escala da vida humana. Um tempo finito (porém imenso) para o Universo implica um início – o Big Bang. Para muitos, um início finito sugere a necessidade de uma Causa Primeira externa à ciência, ou, inversamente, limita o espaço para um Universo concebido como eterno e auto-existente.
A Confusão de Paradigmas: O comentário no chat revela uma conexão fundamental entre a cosmologia e a biologia evolutiva. A idade do Universo é a estrutura de tempo que permite a evolução biológica. Ao tentar descreditar a escala de tempo cósmica, nega-se o tempo necessário para que a evolução por seleção natural ocorra. É uma tentativa de desarmar o relógio para que a história narrada não possa ser contada.
A Natureza da Ciência: O problema para quem acredita (no sentido dogmático) não é com o número em si, mas com a fonte desse número.
A Origem do "Problema" do Número
O valor de 13,8 bilhões de anos (a estimativa mais atualizada[Nota 2]) não é um dogma; é a convergência de múltiplas linhas de evidência que se reforçam mutuamente. Não é um palpite, mas sim o ponto onde a matemática da Teoria da Relatividade Geral de Einstein se encontra com o mundo observável.
1. O Fundo Cósmico de Micro-ondas (CMB)
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O CMB é o eco mais antigo do Universo, a luz remanescente de quando o Universo tinha apenas cerca de 380.000 anos. Medições de satélites como o Planck e o WMAP mapearam as minúsculas variações de temperatura neste fundo. A idade do Universo é inferida a partir de um parâmetro chamado Densidade Crítica, que por sua vez é obtido a partir da análise das flutuações do CMB. É como determinar há quanto tempo um sino tocou pela análise detalhada da propagação do seu som.
2. A Lei de Hubble e a Expansão
O valor final é também coerente com as medições da Constante de Hubble (H0). Este valor descreve a taxa de expansão atual do Universo. Se pudermos determinar a velocidade com que o Universo se expande hoje, podemos "rodar o filme para trás" e calcular o tempo que levou para que toda a matéria observável estivesse concentrada em um único ponto – o Big Bang. Embora haja uma persistente e fascinante tensão entre o valor de H0 obtido pelo CMB e o valor obtido por observações de supernovas distantes (a chamada Tensão de Hubble), ambos os valores levam a uma idade estimada que está firmemente na casa dos 13 bilhões de anos.
3. A Idade das Estrelas Mais Antigas
Se o Universo tivesse, por exemplo, apenas 6.000 anos, como sugerido por certas interpretações literais de textos religiosos, deveríamos encontrar estrelas com 7.000 ou 10.000 anos? A observação das estrelas em aglomerados globulares – algumas das mais antigas do Universo – indica que elas têm idades que variam entre 12 e 13 bilhões de anos. O Universo simplesmente precisa ser mais antigo do que suas estrelas constituintes.
O Confronto entre a Ciência e o Conforto
A ciência não tem a obrigação de confortar. Ela tem a obrigação de descrever o real da forma mais precisa possível, mesmo que essa descrição nos force a abandonar crenças reconfortantes sobre a eternidade ou a necessidade de uma agenda teleológica (um propósito final) por trás da existência.
A beleza da escala cósmica finita reside justamente na sua implicação: o Universo, a vida e a consciência são eventos excepcionais que só foram possíveis porque a história cósmica ocorreu no tempo certo.
O problema com a escala da idade do Universo não é científico; é psicológico. É o conflito entre o método que prova e a necessidade que crê. É a dificuldade de aceitar que, para entender a realidade, não é preciso ser cientista, mas é preciso, crucialmente, aceitar o método científico.
Notas
1."Não é possível convencer um crente de coisa alguma, pois suas crenças não se baseiam em evidências; baseiam-se numa profunda necessidade de acreditar." - Frase seguidamente atribuída à Carl Sagan, dita como sendo citada em Contact (1985), mas a citação não aparece nesse livro. Aparece atribuída a Sagan no livro de Judson Poling de 2003 "Do Science and the Bible Conflict?" (A ciência e a Bíblia entram em conflito?), disponível no Google Books, mas sem fonte. - en.wikiquote.org - Carl Sagan
2.A idade do Universo compreende o tempo decorrido entre o Big Bang até o presente momento. Há alguns anos, a sonda WMAP coletou dados que permitiram estimar a idade do Universo em 13,787 ± 0,020 bilhões de anos. Entretanto, a partir de dados coletados pelo satélite Planck, da Agência Espacial Europeia (ESA), que mapeou o céu entre 2009 e 2013 em busca de pequenas variações na radiação cósmica de fundo em micro-ondas, foi descoberto que o Universo tem quase 100 milhões de anos a mais. Interpretações de observações astronômicas em 2014 indicaram que a idade do Universo é de 13,82 bilhões de anos. - pt.wikipedia.org - Idade do Universo
Leituras recomendadas
Universo tem 2 trilhões de galáxias, 10 vezes mais que o esperado - veja.abril.com.br - 14 out 2016.
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