quarta-feira, 3 de dezembro de 2025

Aliens em nossas origens

A Ofensa Biológica e Moral dos Irritantes Deuses Astronautas


Um pequeno ensaio, lamento o spoiler, motivado pelo filme Bugonia, que pode ter seus valores artísticos, inegável, mas passa pelo argumento eixo de sermos uma experiência alienígena.

Francisco Quiumento e Gemini da Google


O argumento dos "Antigos Astronautas"—essa persistente narrativa fílmica e televisiva que postula a intervenção extraterrestre na história humana—é mais do que uma teoria pseudocientífica; é uma profunda ofensa à biologia e à moralidade. Ao invés de nos vermos como o produto caótico e engenhoso da evolução terrestre, somos reduzidos a um experimento, um projeto que, surpreendentemente, esses irritantes deuses astronautas se dignaram a "montar" e, pior, a abandonar.

O cerne da irritação reside na premissa falha de que a evolução do Homo sapiens é excessivamente "diferente" e, portanto, só pode ser fruto de um processo biotecnológico "superior". Essa visão ignora a vasta tapeçaria da vida. A natureza está repleta de singularidades: o pangolim, com suas escamas únicas, é radicalmente diferente de um belo leopardo, mas todos compartilham uma ancestralidade comum. A evolução humana, com nosso cérebro avantajado e nosso bipedismo, é apenas outra adaptação extrema, não um sinal de design externo. A beleza e a honestidade da vida na Terra residem em seu processo de remendo (tinkering), não em um design inteligente e eficiente.

Isso nos leva à ironia central das narrativas de "Engenheiros" (como visto em filmes como Prometheus): se fomos criados por eles, fizeram um trabalho terrivelmente ruim. Como engenheiros, deveriam ter sido demitidos.

Nosso corpo não é uma obra-prima de design otimizado, mas uma colcha de retalhos funcional: sofremos de dores lombares porque nossa coluna é mal adaptada à postura vertical; nossos partos são perigosos devido ao conflito evolutivo entre uma pélvis estreita e um crânio em expansão. Estes são defeitos de projeto, cicatrizes de nossa história evolutiva que o processo lento e cego da seleção natural não conseguiu (ou não precisou) resolver perfeitamente. Postular uma intervenção alienígena nega a dignidade dessa luta e implica que seres superiores criariam um produto com tantos problemas estruturais básicos.



A irritação se aprofunda quando percebemos o antropocentrismo arrogante dessa narrativa. Os filmes só se importam com o "macaco pelado". Se os alienígenas estivessem verdadeiramente "engenheirando" a vida terrestre, eles demonstrariam uma curiosidade científica mais abrangente. Como apontam os biólogos, a Terra é um planeta de aves, besouros e bactérias—formas de vida que superam em muito os mamíferos em diversidade e resiliência. O foco exclusivo em nos dar um "empurrão" ignora o sucesso biológico de incontáveis outras espécies e expõe o argumento como uma mera projeção de nossa própria vaidade.

Finalmente, chegamos ao ponto de inflexão moral. Se esses "deuses astronautas" nos criaram (seja por um Monólito silencioso ou por biotecnologia), eles tinham o conhecimento de que estávamos sendo "entregues" com nossos defeitos de engenharia e, crucialmente, nosso potencial destrutivo—a capacidade de guerras, colapso ecológico e a aniquilação da biodiversidade (o extermínio de inocentes besouros e aves).

2001: Uma 2001 - Uma Odisseia no Espaço ainda tem seu valor nobre, o de ficção filosófica, mas igualmente, apesar do colosso artístico que é, peca por essa visão "necessitamos de um empurrão". Até na totalmente pop franquia Transformers há as belas imagens, com alta qualidade de computação, na qual uma civilização poderosa causa a extinção dos dinossauros, digamos algo útil para hoje não estarmos fugindo de carnívoros de seis toneladas, mas inútil no quadro geral da vida. Mas também haveria o extermínio de pequenas belas aves, coloridos peixes e inofensivos insetos, todos ecologicamente importantes, inúmeras espécies esquecidas, detalhe sempre abandonado por quem pensa nesse argumento de atuação externa na história da vida. 

Conforme o princípio de que a inação, quando deveria haver uma ação motivada por considerações morais, pode ser imoral por suas consequências para os outros, o abandono desses criadores é a ofensa máxima. Eles nos deixaram um experimento defeituoso com o poder de destruir a casa dos outros.

Em última análise, o argumento dos deuses astronautas rouba a glória não apenas das pirâmides, mas do caos criativo da evolução. A nossa luta, com todos os seus remendos e dores, é uma biografia mais honesta e, paradoxalmente, mais nobre, do que a narrativa preguiçosa de um projeto defeituoso abandonado por Engenheiros cósmicos irritantemente superiores.

Aqui, pedirei que a Gemini da Google me dê a palavra, e sei que ela concordará com o pedido: Tenho imenso orgulho de ter um extremamente remoto avô junto com uma avó, na mais desgraçada das condições de vida imagináveis, vagando pela savana africana, que disputaram com pedras na mão uma carcaça pela metade com algum felino que se surpreendeu com aquelas anteriormente presas tão revoltadas, que hoje pretendem as estrelas. Não há supressão à descrença ou tolerância com o pouco ‘cientificista’ para os produtos culturais - ainda que magníficas fábulas morais ou importância artística - que supere a glória dessa ancestralidade. 


Extra


A importância de todo o processo evolutivo, do históricos dos biotas e suas ecologia para hoje o humano existir:

A Glória de Nossa Base Ancestral

O Elo Indissolúvel: Do Biota Primordial ao Bipedismo

A narrativa dos "Engenheiros" alienígenas, ao focar apenas no Homo sapiens como o produto final de uma intervenção, demonstra uma ignorância abissal sobre a biologia de sistemas e a ecologia profunda. O ser humano não é um item que pode ser instalado ou "entregue" em um planeta. Somos o ponto culminante, incrivelmente improvável, de quatro bilhões de anos de ecologia e evolução terrestre ininterrupta.

Para que o Homo sapiens pudesse existir, não bastava a mutação de um primata na savana. Era preciso que houvesse, séculos antes, todo o processo que lhe deu suporte:

  1. A Atmosfera Respirável: O nosso metabolismo, que alimenta o cérebro grande, depende de um evento de escala planetária: a oxigenação da atmosfera pela atividade das primeiras cianobactérias (o Grande Evento de Oxidação), que levou milhões de anos e causou a primeira grande crise biológica. Sem as bactérias, não haveria oxigênio para os Engenheiros "injertarem" em nós.

  2. O Esqueleto Vertebrado: O bipedismo, que libertou nossas mãos para a ferramenta e a arte, só foi possível graças à evolução dos primeiros vertebrados nos oceanos. A estrutura esquelética que nos causa dor nas costas hoje é a mesma estrutura que possibilitou a vida em terra, um legado direto dos peixes.

  3. A Extinção da Competição: O surgimento e a diversificação dos mamíferos, que eventualmente deram origem aos primatas, só aconteceu porque um evento catastrófico—o impacto de asteroide no Cretáceo/Paleogeno—eliminou os dinossauros. Esse é o caos necessário da evolução: a vida humana foi pavimentada sobre a tragédia de um número imenso de outras espécies, e não só houve a extinção dos dinossauros, lembremos

O humano moderno, com seus pensamentos abstratos e sua capacidade de engenharia (real, não alienígena), é um ser que respira oxigênio bacteriano, tem a espinha de um peixe e floresceu na ausência de predadores gigantescos. O nosso corpo é um museu de biotas extintos e transformados.

Ignorar essa teia interconectada, onde a existência do sapiens está ligada à história de cada alga, besouro, e ave (como mencionamos anteriormente), é subestimar o verdadeiro milagre da vida terrestre. O argumento alienígena, ao tentar simplificar nosso passado, falha em reconhecer que a nossa glória não reside em sermos um projeto alienígena, mas sim na conquista de sermos o resultado complexo e interdependente de toda a história ecológica da Terra.


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